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Sigmund Freud, criador da Psicanálise. |
Após anos de terapia psicanalítica,
as convicções que carregamos são postas em xeque, de tal maneira que uma transformação
interior se torna incontornável. Ela pode ser lenta, mas é seguramente
inadiável. Com efeito, ao mesmo tempo que algumas certezas caem por terra,
outras surgem como uma força inesperada, um surpreendente ânimo, que nos toma
pelo braço e que guia os nossos passos rumo a um tentador desconhecido, um mundo à
espera de ser redescoberto inúmeras vezes. Creio que fazer uma terapia
psicanalítica é, em boa medida, mergulhar naquilo que é próprio do mistério
humano: o inconsciente.
Não é por acaso que, para a formação
de um psicanalista, é indispensável a
experiência da análise pessoal. Como ajudar alguém a realizar essa inóspita travessia sem
tê-la feito por conta própria? Ora, foi ao fazer a minha terapia, que me senti
seguro para considerar a possibilidade de iniciar uma formação teórica em
Psicanálise. Foi decifrando meus atos falhos, meus lapsos, minhas insistentes
repetições e manias que cheguei ao ponto de me perguntar: por que não se
arriscar a decifrar outrem? Seguramente não houve uma luz que caísse do céu
sobre mim; em outras palavras, não houve uma mudança súbita, mas sim uma transformação gradativa, como um infante
que aprende aos pouquinhos sobre o mundo à sua volta.
Ainda assim, persiste a pergunta:
por que se tornar um psicanalista? o que me move nessa peculiar direção?
Suspeito ter em mim um desejo sigiloso,
uma vontade peculiar em ver desabrochar, à minha frente, os segredos, os delírios,
os devaneios, as sandices e desejos da mente humana. É como se eu quisesse ser
a privilegiada testemunha daquilo que só ouvimos falar nos romances
psicológicos de Dostoievski, ou nos melhores filmes hollywoodianos ou, ainda, em
histórias diversas, que só a imaginação criativa do Homo Sapiens é capaz de criar. Também desejo ajudar, é claro, com uma
ética da escuta que acolhe quaisquer pensamentos. Isso inclui desde as divagações
mais ordinárias, até às ideias que a nossa sociedade costuma ignorar, condena e
vilipendia.
Dito isso, creio ter dado cabo (momentaneamente)
a uma questão insistente, que se fará presente pelo resto da minha vida. Pois,
ser psicanalista, é uma espécie de vocação, para a qual temos de revolver o
terreno das dúvidas à procura de respostas, para a qual temos de insistir em
redescobrir o sentido de deitar no divã, de estudar os textos teóricos e de
acompanhar aqueles que nos procuram. A jornada (felizmente) nunca acaba; ela se
prolonga até onde for a nossa busca, o nosso anseio por compreender o mundo, a
existência e o desejo.
Daniel
Viana