Como a maioria dos que vivem neste lado do Atlântico chamado Brasil, meu mais sincero desejo é ver a liberdade, a igualdade e a prosperidade se realizarem, permanecendo acesas e vivas por longos anos à nossa frente, até que o último dos nossos irmãos liberte-se do cativeiro que lhes foi imposto desde a origem da Modernidade, quando os conquistadores ibéricos deram início a este empreendimento colossal que chamamos de “terra abençoada por Deus”.
Aqui,
tratarei de um patíbulo sinistro, embora fascinante: o Brasil.
Antes
de mais nada, peço licença aos peritos e acadêmicos, pois, de fato, não sou
alguém que possa qualificar-se como especialista nos temas que me arriscarei a
delinear neste ensaio. Faço-o, pois, com a travessura de um intrometido no ramo
das ciências humanas e sociais, que sempre me cativaram, particularmente, na
leitura das obras de Gilberto Freyre, Sergio Buarque de Holanda, Darcy Ribeiro,
Caio Prado Júnior etc.
Os
escritos destes velhos professores se apossaram do meu olhar ao longo de muitas
noites insones, enquanto me balançava na rede da varanda ou esparramado no sofá
da sala e, a despeito de certos nomes serem, severamente, criticados por autores
contemporâneos, alguns de seus trabalhos me deram elementos para compreender a
realidade presente, tanto na cidade quanto no campo, tanto nas capitais quanto
nos rincões mais obscuros e afastados do nosso país.
Tamanha
ânsia por explicações iniciou-se com as mudanças que vieram à tona em Junho de 2013.
Eu estive presente nas manifestações que passaram a ser conhecidas como
Jornadas de Junho, e, após mais de dez anos, posso afirmar que a minha vida
nunca mais foi a mesma. Ver com os próprios olhos e contribuir para que
história do seu país mude, é algo que poucos podem reivindicar para si, ainda
que, passados alguns anos, nem tudo nos tenha sido favorável. Acho que, daqui a
muitos anos, quando já estiver perdendo as memórias da juventude, o dia 20 de
Junho de 2013 sobreviverá nos recantos mais profundos do meu ser.
Desde
aquela época que me sinto tomado pela urgência de entender esse gigante de pés
de barro e o continente à sua volta, a América Latina, bem como as causas do
surgimento de uma nova ordem mundial, olhando desde o fim da União Soviética
até a Guerra Russo-ucraniana, passando pela emergência da China e o
aprofundamento da crise dos Estados Unidos. Que novo mundo é esse que emerge assolado
por conflitos e crises de toda espécie? Creio que a resposta para essa pergunta
ainda me ocupará o resto da vida, sem qualquer garantia de soluções fáceis ou
verdades autoproclamadas.
Admito
estar embevecido por um indiscreto atrevimento, que talvez se deixe notar na larguíssima
abrangência histórica deste texto, nas declamações pétreas, nas conclusões
acusatórias, mas, ao mesmo tempo, esboço estas ideias, provenientes de uma
aguerrida determinação e um fervor quase que missionário, com a convicção de
quem há muito aprendeu a interpretar as oscilações de um país caótico como o
nosso. Portanto, cada linha deve refletir-me por inteiro. Sei bem o peso das
palavras, porque aprendi a esgrimi-las com a precisão e o destemor de um
espadachim florentino, cujo florete de aço é suficientemente hábil em retalhar
até as armaduras mais sólidas.
Escrevo
o que penso do Brasil hoje, de tal maneira que, inevitavelmente, haverá rabiscos
que não atenuarão minha ojeriza quanto às amarras do presente. Posso incomodar,
de maneira profunda e visceral, quem busca florear o retrato deste país, tão
querido e aviltado, terra do samba e do Carnaval, o recanto mais caloroso e
receptivo que se encontrará abaixo da linha do equador. Por isto, caso você não
queira ser tomado por uma acidez desesperançada, afaste-se destas páginas e não
volte até que a consciência clame por uma dose de lúcido dissabor. Não vou
prometer-lhe a mais ínfima nesga de otimismo, de amanhecer ilusório. Aqui, só
se encontrará a sinceridade de um homem simples, que se atreveu a ver a nossa
terra pelo prisma da mais colérica revolta.