Hoje, o mar estava cor de jade; acobertado por um manto nebuloso e exprimindo
aquele tom esmeraldino proveniente das rochas tiradas da profundeza, sua
essência era por demais remota e sua calmaria perturbava-se com os ventos
vindos do Sul.
As
nuvens lhe davam, ao mesmo tempo, uma expressão de agouro e contrição,
sobriedade e encantamento. Mas, ainda assim, faziam-no mais apaixonante que a propalada
beleza humana, espalhada por murais e bajulada em infindáveis textos românticos.
Aquilo que eu pude ver não precisava de arranjos, enfeites ou cosméticos,
porque era, simplesmente, belo. E foi isso que me levou ao seu encontro.
Porém,
aos demais, nada escapava à sua indiferença, um desinteresse tão vazio quanto mórbido
— eles queriam sol, mas não podiam vê-lo; queriam águas mornas, mas elas
estavam frias demais; queriam corpos nus, mas se viram diante do próprio
reflexo. Para eles, aquela não passava de mais uma praia e de mais um céu,
outro ponto turístico em sua checklist
tediosamente fabricada pelo senso comum. No dia seguinte, eles iriam para outro
lugar qualquer, tirando suas fotos, fazendo suas poses, fabricando amores…
Quando
o assunto é viajar, a maioria se contenta com o turismo de manada, quando, na
realidade, nós deveríamos nos atrever a ficar face a face com o mais completo desconhecido,
com aquilo que menos se espera topar na rua. A possibilidade de se surpreender
com algo que lhes fuja do controle, causa tremores febris nessa gente; não é por
acaso que suas vidas sejam tão deprimentes e suas mentalidades simplórias; eles
se contentam com quase nada do que o mundo lhes tem a oferecer, conservando-se miseráveis
seguidores da turba que lhes afaga o coração. Não duvido, portanto, que eles passem
pela existência sem terem, realmente, vivido.
Quanto
ao prazer do reencontro familiar com o mar cor de jade, que é tão exuberante
quanto qualquer outra beleza que surja por aí, dedico esta crônica às vésperas
do suntuoso verão brasileiro. Ao contrário de outros lugares, o calor paraibano
ainda guarda uma suavidade, quase que primaveril, de modo que se trata de um
privilégio estar aqui, sentado na poltrona do quarto, tendo a praia do Bessa ao
alcance dos meus olhos. Poderia largar tudo que me prende a essa cadeira, a
essa busca por mais um ganha-pão, e ir ao seu encontro na tênue linha do
horizonte, onde céu e mar, enfim, se beijam.
Às
vezes, sou tomado pela vontade de gritar às ondas que se sucedem numa
inconcebível eternidade:
—
Por favor, nunca me privem do teu som, do teu cheiro e dessa imensidão que
nunca se exaure! Pois, seja de manhã ou ao final da tarde, no verão abrasivo ou
no inverno acinzentado, teu encanto sobre mim se provará imediato! Prefiro teu
contorno, tua silhueta ondulada, tua reentrância singular, a qualquer praia televisiva,
a qualquer balneário novelesco. Contigo por perto, a vida acaba sendo menos
dura e amarga, menos tenebrosa e solitária.
É
assim que caminho rumo às águas trazidas pelo místico oriente, de onde nossos ritos
e magos provieram e de onde o sol emerge triunfante. Gozo ao mergulhar nas suas
ondas e sorvo por entre as mãos seu sumo verdejante; abraço suas águas como
quem, finalmente, revê um sincero amigo e me atrevo a ir até onde posso
alcança-lo, sem medo de me afogar em sua generosidade.
Quem
pode tirá-lo de mim agora?
Daniel Viana de Sousa
© Todos os direitos reservados
Nenhum comentário:
Postar um comentário